SE O OE CHUMBAR COMO SE GEREM AS CONTAS PÚBLICAS?
Após os anúncios do PCP e do BE, todos os sinais apontam para um chumbo do Orçamento do Estado para 2022. O Presidente da República já avisou que, caso isso se confirme, pretende iniciar o processo de dissolução da Assembleia da República “logo, logo, logo a seguir”, o que deverá conduzir a eleições no início do próximo ano, provavelmente em meados de janeiro. Qual é a pressa do Presidente? Governar sem orçamento deixa limitada a gestão das contas públicas. E como?
O que significa governar em duodécimos?
Sem orçamento aprovado, significa que a partir de dia 1 de Janeiro de 2022, têm de ser aplicados os tectos da despesa de 2021, com um limite de 1/12 por mês. Tendo em conta que o OE 2022 previa um crescimento da despesa, isso significa que haverá menos fundos disponíveis face ao planeado. Além disso, como a lei que vale continuará a ser o OE 2021, terá também de ser respeitada a distribuição de fundos entre os programas, o que significa que essas prioridades também não podem ser alteradas.
Em última análise, como estas medidas que se deixam de aplicar do lado da despesa agravam o saldo orçamental, mas os impostos continuam a ser cobrados, o défice até pode cair mais rápido do que o previsto.
O que acontece às medidas do OE 2022?
Não passam. Tem sido um dos principais argumentos do PS para criticar o chumbo do BE e do PCP. Isso significa que medidas como o aumento dos funcionários públicos e o aumento extraordinário de pensões não serão aplicadas. O mesmo acontecerá com o alívio de IRS, através do desdobramento de escalões ou da já anunciada subida do mínimo de existência. De referir que, no caso dos salários da Função Pública, é sempre possível que, quando o novo orçamento seja aprovado, esses reforços de remuneração, a manterem-se, sejam aplicados com retroativos.
Mais complicadas poderão ser as matérias relacionadas com legislação laboral, como a subida prevista do salário mínimo. São temas extra-orçamento, mas que têm feito parte da negociação do mesmo. Ainda quinta-feira, o Governo aprovou uma série de medidas em Conselho de Ministros, naquilo a que chama a Agenda do Trabalho Digno. Algumas delas representavam aproximações às posições dos partidos de esquerda. O futuro destas medidas pode depender do resultado das eleições.
O que acontece ao PRR?
É a maior incógnita de uma governação em duodécimos. Por um lado, nada impede que os fundos europeus cheguem a Portugal. Por outro, como a execução da despesa está limitada aos tectos do ano anterior – especialmente relevante no caso do investimento público, porque se previa um salto grande em 2022, de perto de 30% -, a sua execução pode ficar comprometida.
Para 2022, o Plano de Recuperação e Resiliência representa uma injeção de três mil milhões de euros na economia portuguesa. É o que permite que o OE 2022 dê um estímulo à atividade, ao mesmo tempo que o défice recue. Ele tem a particularidade de ter objetivos e prazos relativamente apertados de execução que, se falharem, podem comprometer a utilização dos mesmos. Marcelo tem assumido a execução do PRR como uma das suas principais preocupações, tendo já falado em “governar com o OE deste ano dividido por 12 e sem fundos europeus”.
No entanto, até isso pode ter solução. Especialistas ouvidos pelo Expresso sugerem ser possível fazer uma alteração urgente ao OE 2021, dirigida especificamente à execução de fundos europeus, para conferir maior flexibilidade a 2022. A própria natureza contabilística dos fundos poderá permitir alguma flexibilidade na execução.
Quando haverá novo orçamento?
Depende muito de como Marcelo Rebelo de Sousa gerir os prazos dos próximos dias. Em caso de dissolução da Assembleia da República, o Presidente tem de marcar eleições com uma antecedência mínima de 55 dias, mas que começam apenas a contar após a publicação do decreto presidencial. Antes disso, Marcelo terá ainda de ouvir todos os partidos com assento parlamentar e convocar o Conselho de Estado. Isso permitiria convocar eleições a partir do início de janeiro do próximo ano, provavelmente em meados desse mês. O Presidente parece ter esse calendário na cabeça. Há semanas, dizia que os timings deveriam significar “um Governo em fevereiro e um novo orçamento em abril”.
Contudo, essa não é a única incógnita para perceber quando haverá um novo orçamento. Se o resultado eleitoral deixar o Parlamento com uma composição semelhante à atual, não é claro que fiquemos mais próximos de uma aprovação.
IN SAPO